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Do vício silencioso às consequências sociais: os perigos da pornografia

  • Foto do escritor: De Mulher Para o Mundo
    De Mulher Para o Mundo
  • 30 de mai.
  • 6 min de leitura

O vício em pornografia influencia relações, autoestima feminina e alimenta padrões irreais e perigosos para toda a sociedade.



Só no maior site de pornografia do mundo, o “Pornhub”, são cerca de 23 bilhões de novos usuários durante 1 ano. A receita que todo o conteúdo de pornografia (revistas, demais sites, CDs e DVDs) gera é de mais de 90 milhões em um prazo de 12 meses.

 

É um número alarmante, que consegue superar grandes streamings como Disney+ ou Netflix, que são gigantes do meio. Só no Brasil, são 22 milhões de pessoas que procuram por conteúdos +18 anos. O maior número de telespectadores está entre os homens (cerca de 70%) que, geralmente, têm menos de 35 anos.



Mas isso não inibe as mulheres de procurarem pelo consumo também: em 2022, 36% das mulheres consumiram vídeos voltados para conteúdo adulto. O número é menor do que o do público masculino, principalmente pelas propostas dos filmes, que são voltados quase que 90% para o prazer sexual masculino. 

 

O que preocupa nesse grande consumo é o conteúdo dos vídeos: sexo brutal, em que a maioria dos homens está em posição superior da mulher, tem o cargo de protagonista da narrativa. Além disso, são também agressores das parceiras. Toda a história gira em torno da ejaculação desse homem. 

 


88% dos filmes pornográficos contêm agressão física e verbal feita por homens. Além disso, podemos ir mais a fundo, explorando sites de conteúdo adulto em desenho, os famosos “HENTAI”, em que os filtros “estupro”, “incesto”, “harém”, são os mais acessados. Provando, mais uma vez, que o importante é o prazer do homem, seja ele conquistado de maneira consentida ou forçada. 

 

Nossa equipe conversou com Bruna Romanato, 39 anos, sexóloga chancelada pela ABRASEX, que explica um pouco mais sobre o vício em pornografia e os malefícios ocasionados por esse consumo exacerbado:

 

A pornografia atrapalha os relacionamentos no sentido da projeção. Você está sempre procurando algo, alguém, que não é seu parceiro ou parceira. Então, projeta coisas onde você gostaria de estar, coisas que você gostaria de fazer, que você acredita, o problema maior é que a pornografia não é verdadeira”, explica Bruna, que completa que, apesar dos avanços significativos do ramo e das mudanças da nova fase (que busca algo mais caseiro, mais real e menos ensaiado), ainda existem muitos truques e o homem é mantido no centro da narrativa.

 

Quando voltado para mulheres, Bruna é enfática: “como o filme pornô é muito sobre o homem, o que o homem vai gostar de ver, não a mulher, é sempre sobre uma vulva infantilizada, sem pelos, com orgasmos exagerados, fluidos exagerados, pênis exagerados. Tudo aquilo é muito exagerado, é quando vai ver na vida real, não tem aquilo, isso falta. Então a mulher sempre está em busca de conseguir o ideal daquela modelo”, Bruna conta que, em sua fase de descoberta sexual, procurou saber como conseguir mais saliva para as relações, mesmo sabendo que as atrizes dos filmes pornográficos possuem truques para as câmeras. “É muito ruim para a mulher essa pressão, do quanto ela precisa ser igual aquela mulher do filme.


Bruna completa sobre o ato: “o principal mito ocasionado pelos filmes pornos é de que a mulher gosta daquele sexo brutal, com força, que não é a realidade. Alguma pessoas brincam com os homens que fazem o ato de maneira mais calma e moderada, mas são esses que geralmente acertam o prazer feminino, o que sabe o ritmo certo”, ela explica que a mulher normalmente atinge o orgasmo na preliminar, que é uma parte vital e que faz parte da relação sexual. Isso é o que mais influencia no orgasmo feminino. Além disso, Bruna também explica que o conceito da da vulva “rosinha e sem pelos” afeta muito a autoestima da mulher. 

 

Consumir conteúdo pornográfico, inquestionavelmente, afeta as relações amorosas (ou não), em geral. Digo "ou não" porque acredito que relacionamento amoroso seja a primeira coisa que pensemos quando falamos de relações humanas X pornografia, mas o indivíduo que consome esse tipo de conteúdo, levando em consideração a constância, acaba percebendo o ato sexual — o afeto — como algo mecanizado e bruto", destaca a psicóloga para mulheres Melanie Kurokawa.


Outro impacto inegável do consumo exacerbado de pornografia e as exigências irreais de performance que ele cria se dá sobre a saúde masculina: cada vez mais cedo, os homens passam a ser usuários de medicamentos como tadalafila e sildenafila (o famoso Viagra) sem uma necessidade real ou sequer prescrição médica. Essas substâncias podem causar efeitos colaterais como dor de cabeça, indigestão, dor nas costas, congestão nasal, alterações na visão ou audição e outras consequências a longo prazo. Isso sem citar a dependência.


Impactos sobre autoestima e autoimagem feminina


O procedimento de ninfoplastia, também conhecido como labioplastia, é responsável por reduzir o tamanho dos lábios da região íntima da mulher. O país que lidera essa cirurgia é o Brasil. A terra do verde e amarelo também está entre os 10 países com mais conteúdo de pedofilia infantil no mundo.

 

Os dados não mentem: os homens buscam por vulvas infantis, sem pelos, tamanhos ou cheiros, pois fazem parte de um sistema que consome diariamente pornografia e até mesmo conteúdo infantil generalizado. 

 

As mulheres, em busca de entrar nesse padrão, passam a recorrer à cirurgia para redução de lábios íntimos, passam constantemente pela retirada de pelos e tentam ao máximo manter uma aparência infantil de suas partes íntimas que é quase impossível de atingir naturalmente, já que se tratam de mulheres adultas. 

 

Bruna conclui: “As mulheres não gostam da própria vagina, da própria vulva, isso é compulsório, é ruim! Então eu sempre falo sobre isso, sobre as mulheres começarem a se gostar mais, se conhecerem mais. Todas são bonitas, todas são diferentes, e que essas mulheres precisam olhar outras coisas, outras referências que não o filme pornô, porque senão elas nunca vão gostar da sua. Existe até um site, se chama The Vulva Gallery no qual eu falo sempre para as mulheres acessarem e se reconhecerem, para verem que são normais e bonitas como são”.

 

Cultura pop

 

Na cultura pop, existem grandes exemplos sobre como o machismo afeta as relações sexuais, não só para as mulheres, para os homens e principalmente para crianças que estão entrando na puberdade.

 

É o caso da série ‘Adolescência’: na produção da Netflix, Jamie, um garoto de 13 anos, é acusado de matar a colega de escola, Katie. É provado por imagens da câmera de segurança que ele é o autor do crime e, desde então, tenta-se descobrir a motivação do ato.

 

Jamie era assíduo das redes sociais, postava constantemente fotos de mulheres com pouca roupa em seu Instagram, com legendas bem machistas. A colega Katie já o havia rejeitado e, dessa vez, usou emojis que diziam que ele fazia parte da comunidade “incel”.


 

Essa comunidade é composta por homens que não conseguem obter satisfação sexual plena e culpam a mulher pelo seu fracasso. Jamie se aproveita de que a colega tem fotos íntimas vazadas e tenta se aproximar, ficando revoltado quando ela o rejeita.

 

Jamie premeditou o crime, seguindo a colega com uma faca emprestada pelo amigo de classe. Ele a mata, se livra da arma do crime e ainda tenta esconder as roupas utilizadas no dia, menos o tênis, que era caro. Mais uma analogia de que o valor do tênis era maior para ele do que a vida de Katie.

 

Depois de descoberto, Jamie passa a ter constante acompanhamento de psicólogos, que precisam determinar se ele é capaz de ser julgado ou não. Bryone Ariston faz um exímio trabalho como psicóloga e lida com as tentativas de manipulação do adolescente, que tenta cativá-la, e quando não consegue, explode de raiva. 

 

A série mostra como o consumo de pornografia e a propagação do machismo pode ser venenoso, letal e perigoso, tanto para mulheres, como para homens.


 

Também temos o romance ‘Um lugar bem longe daqui’, disponível na Netflix e na Amazon, que retrata a vida de Kya, que sofreu espancamento na mão do pai, foi abandonada por toda a sua família e precisou sobreviver sozinha.

 

Em sua história, Kya se envolve com um rapaz, que escondia que era noivo de outra pessoa. Ele a convence a fazer uma viagem, tem uma primeira noite em um hotel, de maneira terrível, cruel e sem emoção alguma ou cuidado com a mesma. 

 

Kya termina com o rapaz e passa a ser perseguida pelo mesmo que a espanca e tenta estuprá-la. O drama também retrata como o machismo, sentimento de posse e vontade de possuir uma pessoa como um objeto é letal e doentio.


Do ponto de vista da Psicologia


A psicóloga Melanie Kurokawa destaca, ainda, que, “falando principalmente sobre o público masculino, quando navegam por esses conteúdos, é comum que o sentimento sobre mulheres, mesmo que não parceiras sexuais, seja deturpado. São fantasias de algo inalcançável e ações exageradas que criam uma falsa realidade, podendo culminar em frustração e distorção do real. Logo, o resultado é nítido: homens que interpretam reações de mulheres reais com os olhos em atrizes de conteúdo adulto. Isso implica em relações heteronormativas potencialmente abusivas e, claro, interações sociais precárias, em geral”.

Para Melanie, há uma maneira clara de combater os perigos da pornografia: “A saída, para mulheres e homens adultos, não é unilateral. É individual, subjetiva e merece atenção, caso a caso. De qualquer forma, o acesso à informação e a segurança sobre nossos próprios corpos deveriam começar na infância, com a educação sexual”.


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